Foto: Alicia Andrés
José Mário Silva (París, 1972). Reside en Lisboa. Es poeta, periodista y crítico literario. Muy recomendable su blog: Bibliotecário de Babel y su poemario: Luz indecisa.
recreio
Caruma, raízes escuras, manchas
de luz entre as árvores. Enquanto
ali estávamos o colégio era um
vulto branco a arder ao sol,
lugar de gramática e geografia,
salas onde a voz do ditado
ecoava e a que nem sempre
queríamos regressar. Às vezes
a tarde imobilizava-se quando
partíamos pinhões com pedras
aguçadas e sentíamos nos dedos
a textura da resina. Jogávamos
à bola com pinhas, usávamos
cuspo para limpar o pó dos sapatos
ortopédicos, esfolávamos joelhos
– rituais infantis como tantos outros,
condenados à nostalgia.
de luz entre as árvores. Enquanto
ali estávamos o colégio era um
vulto branco a arder ao sol,
lugar de gramática e geografia,
salas onde a voz do ditado
ecoava e a que nem sempre
queríamos regressar. Às vezes
a tarde imobilizava-se quando
partíamos pinhões com pedras
aguçadas e sentíamos nos dedos
a textura da resina. Jogávamos
à bola com pinhas, usávamos
cuspo para limpar o pó dos sapatos
ortopédicos, esfolávamos joelhos
– rituais infantis como tantos outros,
condenados à nostalgia.
recreo
Aguja de pino, raíces oscuras, manchas
de luz entre los árboles. Mientras
estábamos allí el colegio era un
bulto blanco ardiendo al sol,
lugar de gramática y geografía,
salas donde la voz del dictado
resonaba y donde no siempre
queríamos volver. A veces
la tarde se detenía cuando
partíamos piñones con piedras
afiladas y sentíamos en los dedos
la textura de la resina. Jugábamos
a la pelota con piñas, usábamos
saliva para limpiar el polvo de los zapatos
ortopédicos, se nos excoriaban las rodillas
-rituales infantiles como tantos otros
condenados a la nostalgia.
insones
Fumam à janela, o vento frio
desfaz o fumo, os dedos tremem.
Não sabem uns dos outros,
espalhados pela cidade, mas
procuram as luzes ainda acesas
noutras casas. Noite dentro,
o silêncio dos que dormem
é uma afronta, desleixo pueril
de quem consegue ignorar
as facadas do tempo, a areia
entre os dedos, o sobressalto.
desfaz o fumo, os dedos tremem.
Não sabem uns dos outros,
espalhados pela cidade, mas
procuram as luzes ainda acesas
noutras casas. Noite dentro,
o silêncio dos que dormem
é uma afronta, desleixo pueril
de quem consegue ignorar
as facadas do tempo, a areia
entre os dedos, o sobressalto.
Insomnes
Fuman en la ventana, el viento frío
deshace el humo, los dedos tiemblan.
No saben unos de otros,
esparcidos por la ciudad, mas
buscan las luces aún encendidas
en otras casas. Noche adentro,
el silencio de los que duermen
es una afrenta, descuido pueril
de quien consigue ignorar
las puñaladas del tiempo, la arena
entre los dedos, el sobresalto.
José Mário Silva
De Luz indecisa (Océanos, 2009)
Traducción: Verónica Aranda
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